A vida e a obra da palhaça, atriz e diretora de teatro Selma Bustamante serão retratadas no documentário “Kandura”, com estreia prevista para março deste ano. Com direção de Wallace Abreu, o filme narra os pontos mais marcantes da trajetória da artista, dos primeiros passos junto ao Grupo Ventoforte, em São Paulo, à consolidação do seu fazer artístico em Manaus, com o Grupo Baião de Dois.
Selma Bustamante é um dos expoentes do teatro amazonense contemporâneo e faleceu em março de 2019, vítima de um câncer. Ajudou a formar vários artistas, principalmente nos campos da palhaçaria e do teatro de rua. “A Selma iniciou muitas pessoas no campo das artes, foi uma mestra, muito importante para a estruturação do movimento artístico teatral que temos na capital amazonense hoje. Embora não fosse amazonense, viveu aqui por 23 anos e deixou um legado muito importante, que tentamos apresentar nos 70 minutos de filme”, explica o diretor.
Selma foi grande incentivadora para o crescimento da ‘palhaçaria’ na cidade de Manaus. “Hoje, temos na cidade diversos artistas trabalhando a linguagem do ‘clown’, que é uma linhagem de uma palhaçaria mais aprofundada, não apenas focada no entretenimento. E a Selma é a raiz desse movimento com sua palhaça Kandura, que felizmente virou uma grande árvore, cheia de frutos”, acrescenta o diretor, que também assina o roteiro da produção, juntamente com César Nogueira.
Em 2017, Nogueira já havia desenvolvido um outro trabalho com Selma no campo audiovisual, o curta documentário “Purãga Pesika”, o qual narra a trajetória da artista, enquanto palhaça Kandura, durante apresentações feitas em comunidades indígenas do alto Rio Negro. “Eu faço a direção de fotografia dos dois trabalhos e para mim, estar realizando esse outro filme é uma forma de trabalhar meu luto, pela perda dessa grande amiga. Eu sou fotógrafo há muitos anos, mas depois que eu conheci a Selma, ela me fez enxergar as coisas de um modo diferente, o que me fez amadurecer muito mais enquanto profissional”, disse.
“A Selma era uma professora, acima de tudo. Ela estava aqui pra ensinar, não só no que tange ao fazer artístico, mas falando sobre a vida, de uma forma geral. Ela era uma mulher muito forte, de opiniões firmes, duras e que falava tudo o que pensava. Isso a tornou grande, a fez ser respeitada, mas também a fez ser apontada e criticada por muitos”, completa Nogueira.
De acordo com o diretor de fotografia e roteirista, o processo de construção da obra foi bastante complexo. Ele explica que a vasta trajetória da artista foi uma das principais dificuldades encontradas. “Passamos por São Paulo e Teresina com a produção do documentário, além das atividades realizadas em Manaus. Tínhamos mais de 10 horas de material bruto para resumir em 70 minutos. Foi um processo muito árduo e tivemos que fazer muitas escolhas, mas agora, já com a obra praticamente finalizada, temos uma narrativa bem interessante para apresentar”, conclui.
Pesquisa
O documentário é fruto de uma pesquisa realizada pelo diretor Wallace Abreu, por meio de projeto contemplado com o Prêmio Funarte de Estímulo ao Circo 2019, e conta ainda com apoio da Prefeitura de Manaus e do Governo Federal, por meio de aprovação no Prêmio Manaus de Conexões Culturais 2020 – Lei Aldir Blanc, e inicialmente tinha a pretensão de ser apresentado como um curta-metragem.
“Quando a Selma faleceu, eu fiquei responsável em fechar a casa dela em Manaus, já que a família dela estava toda em São Paulo. Foi quando vendo todo o material de acervo que a artista tinha juntando ao longo de quase quatro décadas de trabalho, pensei, junto ao César, em documentar a vida e a obra desta artista em um curta, o que logo de cara se mostrou impossível. Eram muitas vozes, muitas histórias, muito material de acervo. Não dava pra compilar tudo em 15 ou 20 minutos”, explica.
Pandemia
“Infelizmente nosso processo iniciou semanas antes da pandemia e logo tivemos que paralisar os trabalhos. Estávamos em São Paulo quando vieram os primeiros registros de casos da doença no Brasil. Conseguimos avançar com o cronograma somente entre agosto e setembro do ano passado, quando conseguimos ir a Teresina, e logo tivemos que interromper novamente os trabalhos. Agora, com a Lei Aldir Blanc, conseguimos entrar na etapa de finalização do filme, mas já tivemos que atrasar nosso cronograma novamente por conta de novos decretos assinados, que nos impedem de realizar algumas ações do projeto. Mas ainda assim, ele estará finalizado até fevereiro e devemos fazer um evento de lançamento em Manaus, em março, quando a artista completa dois anos de morta”, finaliza.
A obra deverá contar ainda com lançamentos em São Paulo e Teresina, cidades onde a artista também realizou trabalhos durante sua carreira. Na ficha técnica, além de Wallace Abreu e César Nogueira, o filme conta com Helena Duarte, na mixagem e edição de som; Marina Bruno e Robert Coelho no som direto; Valentina Ricardo na colorização e finalização; Yan Bentes no designer gráfico; além da trilha sonora original de Edgar Lippo, distribuição pela Doc & Rio Festivals e produção da Cacique Produções.