terça-feira, 14 maio, 2024
terça-feira, 14 maio, 2024

Pães da Amazônia: criações regionais utilizam ingredientes da floresta

Em

Aliando técnicas milenares e simples da panificação à ancestralidade dos produtos da floresta, o pão nosso de cada dia ganha novas cores e sabores pelas mãos do músico e chef padeiro Edgar Montrezol, que é quem cria as delícias da Montrezol Pane, panificadora manauara inaugurada em plena pandemia.

E uma dessas criações é o pão azul, cuja cor provém do jenipapo, de fermentação natural e longa e que, assim como todos os demais pães de Montrezol, também passa a integrar o cardápio amazônico do restaurante Caxiri, localizado no Centro de Manaus, comandado pela chef Débora Shornik.

Apaixonado por música e pela floresta, foi mergulhando nas raízes da família, especialmente inspirado pelo seu pai João Vicente Vitalli Montrezol, filho de italianos, que Edgard começou a colocar a mão na massa e a produzir os pães que hoje inundam sua cozinha numa ampla casa no Tarumã, cercada de floresta.

“Os pães entraram na minha vida pelo meu pai, desde a infância e, entre 2010 a 2013, na Champanheria A Viúva, negócio da família, ele fazia os pães e eu o ajudava na produção do alimento”, explica. Os pães são 100% naturais, totalmente artesanais e maturados, sem nenhum tipo de conservante, e a produção leva em média de 48 horas até 72h para ir ao forno, de onde saem crostas iluminadas, crocantes e recheadas com ingredientes clássicos e indispensáveis na panificação, como chocolate, tomate, queijos, até os amazônicos tucupi, cupuaçu, jenipapo e banana pacovã, entre outros sabores e desejos.

“É um alimento extremamente simples, água, farinha e sal, mas de uma complexidade químico-biológica incrível. E tendo uma visão filosófica, é uma beleza que resume o ciclo da vida. Uma cultura de bactérias, de leveduras, oxigênio, que vão se desenvolvendo, fermentando, se alimentando, indo ao forno e gerando um alimento para os seres humanos”, conta Montrezol.

Mistura de técnicas

O artista dos pães juntou a técnica italiana com a francesa para a panificação, lembrando que a história do alimento remonta até 14 mil anos antes de Cristo. “Não precisa inventar a roda hoje em dia, há uma técnica que precisa ser executada com muita dedicação e amor, adicionando a identidade amazônica. O mundo inteiro olha a Amazônia e a gente precisa oferecer elementos diferentes com esta biodiversidade, maior bioma e maior floresta. Aos poucos vou pegando ingredientes e adicionando aos pães, como o jenipapo, que é maravilhoso. Um fruto verde, usado para pintura indígena, que após ser processado e reduzido na cozinha ganha uma coloração lindíssima, um azul natural da gastronomia”, descreve.

Tucupi, cumaru, pupunha, açaí verde, patauá, abacaba, cara roxo e urucum são outros elementos que enriquecem a Montrezol Pane. “Penso em um panetone amazônico, com cupuaçu, a massa tradicional italiana, maturada por até três dias, e que tenha uma cobertura de folha de bananeira, que dá um sabor de defumado formidável. Temos os pães e a margem para colocar a pitada de Amazônia”, acrescenta o chef padeiro.

Parcerias criativas

A gastronomia brasileira é enorme e está cada vez mais conectada com produto e produtores, e em Manaus não é diferente. A chef Débora Shornik, do Caxiri, trabalha com o alimento como uma manifestação cultural e ancestral, apaixonante e com foco na cadeia de sustentabilidade.

E foi isso que aproximou a chef do padeiro e na parceria inédita que iniciou com o pão azul. A parceria surgiu da busca por fornecedores que comunguem do olhar para produtos não tão convencionais e que possam ir à mesa dos restaurantes, somando repertório à gastronomia amazônica.

“E não é com o intuito de ser diferente por simplesmente ser, mas sim pelo olhar pela sustentabilidade, pela inclusão, geração de renda, buscando ampliar o leque de ingredientes e, logo, de produtores de determinados produtos que por falta de uso são escassos na cidade. Muitas vezes é mais fácil conseguir um morango, uma pera, uma tangerina, do que conseguir frutos regionais nos lugares mais comuns da cidade”, comentou a chef.

E é nessa busca necessária, diária, que Débora mergulha para usar o que a natureza oferece. “E o olhar do Edgard é muito parecido, ele está conectado com processos ancestrais, é fiel a natureza e é o primeiro fornecedor terceirizado do Caxiri. É a primeira vez que abro as portas da minha cozinha para alguém entrar. Foi um encontro mágico, maravilhoso e essencial para este momento de alta demanda do restaurante, e sempre visando não industrializar os preparos”, completou.

Cardápios exclusivos

Outro parceiro e por sinal fã da Montrezol Pane é o chef Marcus Pompeu, que presta consultoria e faz cardápios exclusivos sob demanda na cidade. “Por onde passo procuro sempre colocar um pão do Montrezol em entradas, tostadas ou generosas fatias para lambuzar. Sou apaixonado pela focaccia dele e, apesar de ser cozinheiro e chef há 25 anos, não me atrevo a fazer pães. É necessário muita dedicação e técnica”.

As parcerias para os pães tem tudo para levar a águas mais profundas na Amazônia e a aventuras com ingredientes preciosos, descobrindo texturas e processos, além de usar, com amor, produtos inspirados na sacralidade presente nos elementos da natureza. Dando água na boca e servindo de alimento, com sabor e preparo inigualáveis e abundantes, como a Amazônia é.

Compartilhar
Tags

Mais lidas

Recentes

Veja Mais

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.